Terra Magazine – Você acha que esses ataques são coisa de “traficante emburrado”, como disse o Secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame?
Rodrigo Pimentel – É evidente que é. As ações de terror que visam à promoção do medo e do pânico, de muita visibilidade e que não tem intenção nenhuma de lucro, são ações de terror. São ações de reação não só às UPPs, mas a toda a política de segurança pública do Estado. A UPP é, sim, o carro chefe, é o que está dando mais prejuízo para o bandido. Mas veja só… desde que o governador Sérgio Cabral assumiu, além da pacificação, tem também o encaminhamento de bandidos para fora do Estado. Tem ainda o indiciamento e investigação de familiares de presos. Os familiares que enriqueceram ilicitamente estão sendo investigados e denunciados pelo Ministério Público. Isso provoca no tráfico revolta. Todo mundo dizia que essa UPP era esquisita porque os bandidos não reagiam. Taí a prova de que não era nada esquisito. A UPP é realmente eficaz e tira o território do tráfico. A reação é essa aí…
As UPPs foram implantadas como um contraponto ao policiamento que combate o tráfico com mais violência. Mas aumentaram o policiamento nas ruas e as operações do Bope em favelas. A polícia divulgou nesta quarta que já foram mais de vinte mortos nessa reação aos ataques. Não corremos o risco de regredir?
É importantíssimo isso. Não é a volta da política de enfrentamento. Na verdade é uma consolidação da UPP. O governo do Estado persegue a pacificação como um caminho mais viável e mais inteligente como a única política de segurança pública do Estado – porque até então não havia nenhuma. Se existe uma reação dos traficantes a essa política de pacificação, é evidente que você tem que estancar essa reação. E para estancar essa reação, é operação em favela, sim!
Isso seria momentâneo?
Eu sempre fui um crítico desde tenente, de capitão… Eu sempre fui um crítico contundente da operação em favela. Eu sempre achei uma ação desnecessária e ineficaz, que não tinha o menor motivo. Porque você entrava na favela e saía. E aquilo não tinha fim nunca. Aí surge a UPP que entra na favela e permanece. De fato, funciona. Mas essa política de enfrentamento momentânea é para estabelecer e consolidar o processo de pacificação. Os marginais estão saindo de favelas já identificadas para efetuar pânico no Rio de Janeiro. Para queimar ônibus, matar pessoas… Então a polícia tem sim que invadir esses redutos e tomar esses traficantes. Tem que criar uma zona de desconforto para que eles não possam mais operar essas ações. Além de intensificar o policiamento nas ruas, a polícia tem que voltar às favelas e atacar esses redutos, esses sujeitos. Não tem jeito. É um caminho sem volta. É agora ou nunca. O Estado não pode ser refém, não pode se ajoelhar, não pode recuar um milímetro.
A população não sofre com isso?
Isso não é uma vontade do governo do Estado, não. É uma vontade da população. Todas as pessoas nas ruas estão solidárias às ações da polícia. Nós vamos viver no Rio de Janeiro nos próximos cinco ou seis dias, um pouco de medo, de estresse em sair à noite, de preocupação com o filho na escola. De “será que eu posso ir à faculdade porque a minha aula termina a noite?”. Nós vamos viver um desconforto nos próximos dias, mas se for isso o preço para que a política de pacificação funcione, que seja pago. Está muito claro que isso é um momento. Não é uma política para sempre. É um momento. A política é a pacificação. O que a gente está vivendo agora é um momento importante para a pacificação.
Isso não pode virar um ciclo de ataques de traficantes e reações mais ostensivas da polícia?
Não. Na queda de braço com o Estado, o Estado ganha. Com todos os traficantes que o Comando Vermelho dispõe no Alemão e no complexo da Penha, o Estado já provou que consegue entrar lá. Então, nessa queda de braço quem vai sair perdendo é o traficante. E perde várias vezes. Perde porque a Justiça já entendeu que ele não pode mais ficar no Rio. Ele é uma ameaça à sociedade cumprindo pena aqui. Ele perde em cumprir pena num lugar mais distante, perde em ter seu reduto atacado pela polícia… Sinceramente, eu sou otimista. Se isso aí não fizesse parte de um pacote mais completo de segurança, eu diria que é a repetição de um ciclo que a gente já conhece. Mas não é isso.
Sobre a prisão em outros Estados, o secretário Beltrame informou que há indícios de que a ordem para os ataques tenha vindo do traficante Marcinho VP, de um presídio no Paraná…
Sim, você tem ataques que vieram do Paraná. Mas vieram em função de prerrogativas que os presos possuem no Brasil, de visita a vítimas, acesso a advogados e tal. Uma forma punitiva para eles agora é que eles sejam retirados do Paraná e sejam enviados a um presídio mais longe. Nesse intervalo, eles vão perder semanas de acesso a advogados e a familiares. E isso já descordena as ações reativas desses bandidos.
As UPPs estão instaladas, em sua maioria, na Zona Sul enquanto que investigações apontam que esses ataques estão vindo de outras regiões, da Zona Norte. O processo de pacificação não precisa ser expandido?
É. A UPP começou na região hoteleira da cidade, na região mais nobre e que tem potencial turístico. E isso é evidente em qualquer lugar do mundo. Não é privilégio para os ricos, até porque a UPP beneficia ricos e pobres. A UPP começou na região de Ipanema, Copacabana e Leme. Depois ela foi expandida. Ela já chegou, sim, à Zona Norte. Toda a região da grande Tijuca – que é um bairro de classe média – já está pacificada. E agora ela avança para uma região mais pobre. Já começou no Morro do Macaco, já entrou para o Morro do São João e está caminhando para o Morro da Matriz. Ela já está avançando para uma região… Agora, está longe do subúrbio da Leopoldina ainda, que é essa região que estamos falando da Penha. Está longe, mas ela vai chegar lá. Tanto vai chegar que a reação do bandido é em função disso. É o medo da aproximação da UPP do seu domínio territorial.
Entendo…
Deixa eu falar uma coisa. Eu nunca na minha vida deixei de criticar a política de segurança pública. Eu cheguei onde cheguei onde cheguei – no filme Tropa de Elite, no livro Elite da Tropa – porque cheguei criticando. Mas esse momento que eu vivo hoje da minha vida é um momento único na história do Rio de Janeiro. Eu não tenho nenhuma ligação partidária com o Sérgio Cabral. A gente tem que fazer uma opção: Essa porra tem que dar certo! Se isso não der certo minha amiga… Nós já testamos vários remédios e nada funcionou. O que a gente não testou ainda é a ocupação territorial permanente. Estamos testando e está funcionando. É necessário.
Já que você destaca esse seu posicionamento crítico, o que mudou desde o seu tempo na polícia?
Quando eu era da polícia, eu tinha a nítida sensação de estar enxugando uma pedra de gelo. A gente matava bandido e invadia favela sem ter uma luz no fim do túnel de melhora. Hoje em dia, fora da polícia, eu vejo com muito otimismo o futuro do Rio de Janeiro. Então essa é a melhor mudança. É o otimismo. Eu nunca fui otimista em 12 anos de polícia e hoje eu sou otimista. E olha que eu sou muito mais crítico agora do que eu era anteriormente.
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